A crise da saúde no Brasil vem de
longa data e continua presente no dia a dia da nossa sociedade. Entra Governo,
sai Governo e o que se vê é mais do mesmo!
Freqüentemente nos
deparamos com notícias que revelam filas de pacientes nos hospitais e postos de
saúde, essencialmente do serviço público, além da falta de leitos, equipamentos
e também do mau atendimento por parta dos funcionários.
Erros médicos, pessoas
vendo sua saúde sendo mais agravada pela demora no atendimento; falta de
atendimento nos casos mais graves; falta de especialistas, etc.
E no meio disso fica a
população que precisa de atendimento à míngua de um direito garantido pela
nossa Constituição, para não falar também dos médicos que, em condições
precárias de trabalho, precisando de até cinco empregos para poderem manter uma
vida digna.
Enquanto isso, o que
deveria ser prioridade para todas as autoridades torna-se mais um instrumento
de disputa política. E as respostas à população, um empurra empurra.
Independente do jogo
de empurra, o fato é que há escassez de recursos financeiros, materiais e
humanos, para manter os serviços de saúde operando com eficiência.
Problemas, como atraso
no repasse dos pagamentos do Ministério da Saúde para os serviços conveniados,
baixos valores pagos pelo SUS aos procedimentos médico-hospitalares, entre
outros, consolidam o entrave no setor.
Acrescentando-se a
isso, desvio de verbas, superfaturamento nas contratações e nas compras, desvio
de medicamentos e por último uma enorme falta de competência de gerenciamento
por parte das Secretarias Municipais de Saúde bem como de alguns servidores.
O mundo econômico da saúde é cruel.
Segundo estatísticas
da Abramge/Fenaseg, na rede terceirizada (Planos de Sáude) são gastos R$ 31
bilhões para cuidar de 35 milhões de segurados, enquanto todo o SUS (Pública) para
suprir o direito à saúde de mais de 145 milhões de brasileiros gasta quase a
mesma quantia.
Por essas e outras
razões nos encontramos no 124º lugar no ranking da OMS em qualidade de saúde.
É difícil para
qualquer especialista apontar apenas um motivo para tal crise.
Mesmo com toda a
evolução do contexto político-social pelo qual o Brasil passou, nos últimos
anos, pouco ou nada foi mudado.
Na realidade, em 512
anos de Brasil, independente do regime vigente, a saúde nunca ocupou lugar de
destaque no governo, ficando sempre em segundo plano.
Até hoje, só se olhou
atentamente para o setor quando determinadas epidemias se apresentavam como
eminentes ameaças à sociedade.
É assim desde o Brasil
Colônia, quando o país não dispunha de modelo de atenção à saúde e nem mesmo o
interesse em criá-lo, por parte do governo colonizador. Os conhecimentos
empíricos (curandeiros) eram a opção.
Com a vinda da família
real ao Brasil, se fez necessária a organização de uma estrutura sanitária
mínima, capaz de dar suporte ao poder que se instalava na cidade do Rio de
Janeiro.
A carência de médicos
no Brasil Colônia e no Brasil Império era enorme. Para se ter uma idéia, no
Rio, em 1789, só existiam quatro médicos exercendo a profissão (Salles, 1971).
Em outros estados eram
mesmo inexistentes, o que fez com que proliferassem pelo país os Boticários, a
quem cabiam a manipulação das fórmulas prescritas pelos médicos, mas que na
verdade eles próprios tomavam a iniciativa de indicá-los, cultura comum até os
dias atuais.
Veio a República e o
Brasil continuou o mesmo.
No início desse
século, a cidade do Rio apresentava um quadro sanitário caótico, sofrendo com
doenças graves que acometiam a população, como varíola, malária e febre
amarela.
Isso acabou gerando
sérias conseqüências tanto para saúde coletiva quanto para outros setores, como
o do comércio exterior, já que os navios estrangeiros não queriam atracar no
porto do Rio em função da cidade.
Poderíamos escrever
milhares de linhas sobre o assunto e chegaríamos à mesma conclusão, vos digo
que em pleno século XXI pouco se evoluiu em termos de política de saúde no
Brasil.
Atualmente são
colocados no mercado de trabalho 8.862 novos médicos, provenientes de 120
faculdades de medicina em todo o país.
Esses dados são de uma
recente pesquisa do Conselho Federal de Medicina, que revela ainda que a má
distribuição de médicos no país ainda persiste.
São 65,9% deles
atuando nas regiões Sul e Sudeste, onde se concentra apenas cerca de 25% da
população.
É a saúde continuando
um sistema embrionário e contraditório, onde nos destacamos mundialmente por
nossas pesquisas pioneiras, no combate a Aids, tendo reconhecimento dos nossos
profissionais, mas não conseguimos dar atendimento básico à maioria do povo.
Já passamos da hora de
criarmos um Código Nacional da Saúde, respaldado na eticidade, para que
possamos organizar este setor no Brasil.
Antes de entrar no tema da atual forma de privatização
da saúde, é importante fazer uma análise histórica das políticas públicas de
saúde, as quais são produtos
De um modo geral, é
preciso levar em conta que as políticas públicas de saúde sempre estiveram
atreladas ao interesse do capital.
Desde o início da
intervenção estatal nas questões de saúde, a preocupação fundamental é garantir
a ordem e a higiene pública, além de promover adequação social aos interesses
privados.
No final do século
XIX, a economia brasileira ainda girava em torno da monocultura para
exportação.
Neste momento, a
situação sanitária era extremamente precária.
Uma das principais
causas de óbito eram as doenças infecto-contagiosas e as doenças parasitárias.
Ainda no final da
década de 1940, cerca de 30% da população do Rio de Janeiro, capital do Brasil
na época, morria devido a doenças infecciosas e parasitárias.
Assim, nos últimos
anos do século XIX e primeiros anos do século XX, foram criadas algumas
instituições de saúde ligadas ao governo, como o Departamento Geral de Saúde
Pública e a Fundação Oswaldo Cruz, que atuavam a partir do modelo sanitarista
de campanha, que perdurou até a década de 1960.
Algumas iniciativas de
saúde pública buscavam controlar as endemias durante o processo de construção
ferroviária e realizar o saneamento das regiões portuárias, com o objetivo de
permitir a expansão econômica.
Estas ações eram
essenciais para propiciar a entrada de capital externo no Brasil e a inserção
de imigrantes, os quais serviam de mão-de-obra barata para a elite brasileira.
As políticas públicas
de saúde eram impostas de forma autoritária como, por exemplo, no Rio de
Janeiro com a extinção das moradias no centro da cidade – devido à propagação
de doenças infecto-contagiosas – e a determinação da vacinação obrigatória
contra varíola e febre-amarela.
A imposição
autoritária destas políticas fez com que a população travasse um conflito com o
governo, o que ficou conhecido como Revolta da Vacina.
A urbanização e a
industrialização do país avançaram durante as décadas de 1920 e 1930 e estas
décadas, surgiram então os movimentos operários, que passaram a reivindicar
direitos ligados à aposentadoria, pensões e assistência médica.
Em 1923, foi aprovada
a Lei Eloi Chaves, que garantiu direitos relacionados à previdência (Caixas de
Aposentadorias e Pensões – CAP) e assistência médica, financiados a partir do
desconto compulsório das folhas de salários, não existindo contribuição
estatal, ou seja, a previdência e a assistência à saúde ainda eram
completamente privadas.
Mas esses direitos não
abrangiam toda a população, nem ao menos todos os trabalhadores, pois eram
garantidos apenas para os trabalhadores dos pólos mais dinâmicos da economia,
como os ferroviários, os portuários e os funcionários de grandes empresas
estatais.
Vale ressaltar que os
trabalhadores rurais, que ainda eram a grande maioria no Brasil, não eram
beneficiados.
Na década de 1930,
houve o fim da política do café com leite (revezamento do poder entre a
oligarquia paulista, produtora de café, e a oligarquia mineira, produtora de
leite), mas, como estávamos falando, com o fim da política do café com leite, devido
à crescente industrialização, ao aumento das mobilizações dos trabalhadores
industriais, à superprodução de café sustentada pelo governo em pleno momento
de crise mundial (Crise de 1929) e consequente enfraquecimento das oligarquias.
Assim, após a
Revolução de 1930, Getúlio Vargas assumiu a presidência do país.
Em 1933, as Caixas de
Aposentadoria e Pensões, foram substituídas pelos Institutos de Aposentadoria e
Pensão (IAP).
Os IAPs ainda eram
restritos a determinadas categorias profissionais, mas a contribuição passou a
ser dividida entre empregadores, trabalhadores e governo.
Tem-se aqui já então, uma
relação público-privada nas questões de previdência e saúde do trabalhador.
É também na década de
1930 que ocorre a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública, no qual
existia o Departamento Nacional de Saúde responsável pelo combate às endemias,
formação de técnicos em saúde pública e organização das campanhas sanitaristas.
Com a crescente
importância que o setor industrial assumiu no Brasil, a partir da década de
1950, a prioridade, em termos de saúde pública, passou a ser a garantia das
condições de exploração contínua do conjunto da classe dos trabalhadores e, em
1953, foi criado o Ministério da Saúde, ainda tendo como função central
garantir as intervenções baseadas nos modelos sanitaristas-campanhistas.
A década de 1960 foi
marcada pelo golpe militar e pela implementação do regime ditatorial.
Já a década de 1970
foi marcada internacionalmente pela aplicação do modelo neoliberal na Europa
Ocidental e nos EUA.
No contexto
neoliberal, o setor da saúde passa a ficar cada vez mais vinculado ao complexo
médico-industrial, caracterizado pela imposição dos recursos tecnológicos e da
indústria farmacêutica, além de propiciar a precarização da qualidade do
trabalho em saúde.
“Até mesmo o médico,
que gozava da prerrogativa de ser um profissional liberal, por deter os
processos de ‘produção’ de seu trabalho, sofre um processo de proletarização,
ao ser obrigado a se submeter aos grandes complexos hospitalares, às industrias
farmacêuticas e aos convênios médicos”.
No Brasil, no ano de
1966, em meio ao contexto de grande autoritarismo que freava as mobilizações e
do milagre econômico, foi criado o Instituto Nacional da Previdência Social
(INPS), que é considerado a grande expressão da mercantilização da saúde
através da relação público-privada, com a aplicação do modelo
médico-assistencial privatista.
Com o INPS, a
assistência médica seria garantida apenas para os trabalhadores com carteira
assinada.
Esse novo ajuste
revela a organicidade da relação Estado/saúde em prol dos interesses dos
produtores privados, pois o Estado se reserva a função de organizar a
clientela, financiar a produção de serviços e subsidiar o investimento privado
para ampliação da capacidade instalada.
Eis aí o processo sociopolítico
e histórico que engendra a privatização precoce do sistema de saúde brasileiro
com a conseqüente estruturação da produção de serviços de saúde em moldes
privados e lucrativos, ou seja o inicio do negócio saúde no Brasil.
Assim, à semelhança do
que ocorre atualmente no processo de privatização através das Organizações
Sociais e Fundações Estatais de Direito Privado, o governo passou a financiar o
setor privado, que se responsabiliza pela prestação de serviços.
Dessa forma, é na
década de 1970 que o setor privado na saúde tem condições para se estruturar e
expandir, já que possui “capital fixo subsidiado, reserva de mercado, nenhuma
competitividade e, portanto, baixo risco de investimento.
No ano de 1978, a
partir das indicações realizadas na Conferencia Internacional sobre Cuidados
Primários de Saúde (em que surge a Declaração de Alma-Ata), o governo
brasileiro investe numa estrutura precária de atenção básica de saúde, o que na
realidade buscava somente conter as tensões sociais.
Surge então, também em
1978, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
(Inamps), que deu continuidade ao mesmo modelo-assistencial privatista do INPS.
Já no final de 1970 e
na de 80, período de crise econômica, eclodiram muitas lutas, tanto
específicas, por exemplo, as do movimento estudantil e do movimento operário,
como as gerais, por redemocratização.
E é também neste
momento que surge o movimento de Reforma Sanitária, composto por vários setores
(movimento estudantil, acadêmicos, movimentos populares de saúde, setores da
igreja e sindicais) e diversas posições políticas.
Em 1986, ocorreu a
VIII Conferência Nacional de Saúde, em que se expressou o acúmulo do movimento
da Reforma Sanitária ao tirar como diretriz a organização do Sistema Único de
Saúde, que seria a organização pública do setor, capaz de garantir o direito à
saúde para toda a população brasileira.
Essa diretriz foi
aprovada na Constituição Federal de 1988.
Nela, pode-se destacar
alguns dos princípios do SUS:
- universalidade
(direito de todos),
- integralidade
(conjunto articulado de ações em saúde),
- equidade (igualdade
de oportunidade para usar o sistema de saúde),
- controle social
(participação de usuários e trabalhadores na gestão do Sistema), - descentralização
(respeitando as diferenças regionais e locais),
- hierarquização
(relacionado aos níveis de complexidade) e
- resolutibilidade
(ser eficaz e eficiente).
No entanto, algumas
brechas constitucionais, como sempre, elaboradas pelos governantes e
consentidas pelo movimento sanitarista, permitiram que o ideal de saúde
pública, universal e de qualidade não fosse de fato implementado.
Uma das principais
brechas da Constituição no que se refere ao SUS é a permissão de que a
iniciativa privada assuma a assistência à saúde de forma complementar,
atendendo assim ao modelo neoliberal.
Outra brecha
importante ocorre nas leis 8.080 e 8.142 que regulamentam o funcionamento do
SUS. Elas foram promulgadas em 1990, pelo então presidente Fernando Collor,
grande representante do neoliberalismo brasileiro.
Nestas leis, não há
definição sobre o financiamento do SUS, deixando o Sistema recém-nascido à
mercê das migalhas que sobravam do que era de fato considerado prioridade para
os governantes, como o pagamento da dívida pública.
A implementação das brechas e do modelo de gestão
neoliberal
Desde os primórdios do
neoliberalismo, o que se propõe para a gestão estatal é:
O ‘saneamento’,
encarnado em medidas como:
- redução da despesa
pública;
- redefinição (e
limitação) das funções do Estado;
- redução do número de
funcionários públicos e para-públicos;
- revisão dos sistemas
previdenciários, bem como toda a legislação social;
- desregulamentação e
privatização, submetendo serviços públicos à concorrência;
- ajuste fiscal.
Apesar do pensamento
neoliberal existir desde a década de 1940, é somente a partir de 1990 que o
modelo neoliberal passa a ser hegemônico no mundo.
O espaço para a
ampliação do neoliberalismo foi aberto num período que ocorreu a restauração do
capitalismo no Leste europeu e, em sua grande maioria, através das instituições
da democracia burguesa.
O imperialismo passou
a fazer uma forte campanha ideológica de que o capitalismo é superior ao
socialismo. Muitos militantes de esquerda tornam-se claramente reformistas,
propondo utilizar a democracia burguesa para fazer algumas reformas no
capitalismo.
Eis aqui o vendaval
oportunista, que atingiu a consciência das massas, que começou a abandonar as
mobilizações e passou a apostar em saídas para seus problemas sociais através
das instituições da democracia burguesa e, portanto, através das eleições.
Assim, foi na década de 1990 que o Estado brasileiro,
seguindo os mandos do Consenso de Washington (mais conhecido como Agenda Neoliberal),
teve espaço suficiente para implementar o projeto neoliberal.
Uma das primeiras
coisas que o governo buscou fazer foi o ajuste fiscal, que significou, na
prática, o desfinanciamento das políticas sociais.
As privatizações
também foram foco destes governos, que primeiro privatizaram as empresas
públicas, depois fizeram e estão fazendo o mesmo com os serviços.
Numa conjuntura em que
os governos brasileiros eram claramente neoliberais e que os movimentos estavam
esvaziados e ligados à luta pela cidadania e não mais pelos direitos da classe
trabalhadora, pode-se entender que o SUS, com os seus princípios, jamais
poderia ser implementado de fato.
Para tanto, os
governantes precisaram fazer uso das brechas deixadas na Constituição e na Lei
8.080 e 8.142, além de criar novas formas de legalizar suas atitudes
privatizantes. Ou seja, tornar e adequar para que a saúde atendesse à política
capitalista neoliberal do lucro.
Uma das principais
brechas está no art. 199, § 1º da Constituição Federal de 88.
Este artigo trata da participação complementar da
iniciativa privada no SUS que diz:
“as instituições privadas poderão participar
de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste,
mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as
entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos”.
A primeira questão e a
mais evidente é que este artigo possibilitou que a iniciativa privada fosse
ganhando cada vez mais espaço dentro do Sistema Único de Saúde.
A segunda questão, a qual
é apenas uma forma de viabilizar a primeira, é que já na constituição se
estabelece que a forma de participação da iniciativa privada no sistema de
saúde deveria ocorrer através de contrato, ou seja, por meio da terceirização.
A Constituição fala assim,
em contrato de direito público e em convênio. Com relação aos contratos, uma
vez que forçosamente deve ser afastada a concessão de serviço público, por ser
inadequada para esse tipo de atividade, tem-se que entender que a Constituição
está permitindo a terceirização, ou seja, os contratos de prestação de serviços
do SUS, mediante remuneração pelos cofres públicos.
Para o setor da saúde,
o início da implementação do SUS em meio ao fortalecimento do neoliberalismo se
refletiu, primeiramente, no crescimento da rede pública de saúde básica e de
alta complexidade e na expansão da iniciativa privada no sistema de média
complexidade.
Isso porque o sistema
básico de saúde não gera lucro e o sistema de alta complexidade possui custo
muito alto, o que pode proporcionar grandes prejuízos para o setor privado.
Já o sistema de média
complexidade exige baixos investimentos e a grande parte da população pode
pagar, através de convênios ou particular.
Assim, o Estado, com
dinheiro público, assume para si os riscos e permite os grandes lucros para a
iniciativa privada.
Como diz Elias em seu texto ao tratar do nascimento do SUS
nos anos 90,
“... (o SUS) acossado
pelo o que poderíamos denominar de a nova agenda de problemas, expressão da
atual conformação do Estado, representada pelo acolhimento da mercantilização
da saúde – caracterizada, sobretudo, pela regulamentação do sistema privado de
saúde (planos e seguro-saúde) –, pela ótica do consumidor completamente a
margem do SUS, pela adoção de parâmetros de gestão permeados pela noção de
custo/efetividade ou custo/benefício e pela flagrante insuficiência do
financiamento”.
Porém a implementação
do SUS a partir de bases políticas neoliberais, não poderia se restringir a dar
total espaço para o setor privado atuar no sistema de média complexidade.
Após o Estado ter
investido na expansão da rede básica e de alta complexidade em saúde, o mesmo
passa então a entregar estes equipamentos de saúde nas mãos da iniciativa
privada, que, em contrapartida, não precisa investir um centavo. Veja-se o caso
de nosso Hospital Municipal e até da própria Santa Casa.
Devemos prestar
atenção que, diversas atitudes governamentais, do setor privado e da mídia
fizeram com que essa façanha fosse possível.
Em primeiro lugar,
apesar do financiamento do Estado para a ampliação da estrutura do SUS, o
investimento nunca foi suficiente para possibilitar um atendimento de qualidade
na maioria dos serviços.
É preciso lembrar, que
em 1994 foi aprovada a Emenda Constitucional denominada Desvinculação das
Receitas da União (DRU), que retira 20% do orçamento da União com o objetivo de
garantir o superávit primário e o pagamento da dívida pública.
Assim, a falta de
investimento nos setores sociais, entre eles a saúde, fez com que uma grande
parte da população acreditasse que o sistema privado de saúde poderia
proporcionar melhores atendimentos.
Para reforçar esta
visão, passou-se a propagandear que o SUS, como todo serviço público, não
funciona por um problema de gestão, sendo que o gerenciamento privado seria a
fórmula milagrosa para sustentar um bom serviço em saúde.
Com isso, é esquecido
todo o problema de falta de financiamento do SUS, as regalias oferecidas para o
setor privado e a mercantilização do direito à saúde, permitindo que a
privatização passasse a ser tratada como a grande salvadora da pátria. O que
continua até aos dias de hoje, até mesmo nas administrações tuteladas como
populares que é o caso do Partido dos Trabalhadores.
Neste momento, o mundo
neoliberal, onde o Brasil está incluso, discute a questão do problema de gestão
e lança o modelo da Nova Gestão Pública (NGP).
Este modelo tem por
objetivo a aplicação dos seguintes mecanismos:
- uma administração
pública voltada para resultados (metas);
- um modo plural de
governança, ou seja, possibilitar os contratos entre o Estado e a iniciativa
privada;
- e a flexibilização
da gestão burocrática.
A aplicação deste novo
modelo administrativo no Brasil começa a ser concretizado e legalizado, a
partir de 1995, com a proposta do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do
Estado, elaborada pelo ministro Bresser-Pereira, que comandava o recém criado
Ministério da Administração e Reforma do Estado.
Segundo a visão do
ministro Bresser-Pereira, o sistema administrativo brasileiro, nascido da
Constituição de 1988, tinha realçado os piores elementos do modelo burocrático,
com o reforço da lógica dos procedimentos, a uniformização e o “engessamento”
da estrutura dos órgãos públicos e da política de pessoal, somados ao baixo
controle público da burocracia.
Assim, para mudar essa
situação seria necessário, de um lado, flexibilizar a gestão pública e, de
outro, tomar o corpo burocrático mais accontable em relação aos cidadãos.
No Plano Diretor,
foram estabelecidas quais estruturas seriam de controle exclusivo do Estado e
quais setores poderiam ser repassados para a iniciativa privada de forma direta
ou indireta.
Assim, a reforma
administrativa divide as atividades do Estado em quatro categorias:
Núcleo Estratégico: é considerado propriedade estatal.
Compreende o Legislativo, o Judiciário, a Presidência da República, o primeiro
escalão dos Ministérios e os Ministérios Públicos.
Atividades Exclusivas
do Estado: são
serviços em que o principal usuário é o Estado. Trata-se então de atividades
não lucrativas e por isso não há interesse da iniciativa privada.
Neste grupo
implementaram-se as agências reguladoras (como Anvisa, ANS, Anatel, ANP etc.),
que são órgãos autônomos, responsáveis pela fiscalização e já são constituídas
com um tipo de gestão que permite a flexibilização das relações de trabalho e
também o entreguismo e o controle dos interesses privados, em detrimento dos
interesses públicos.
Setor de Produção e
Bens de Serviços para o Mercado: Aqui, trata-se de empresas públicas que garantiam
infra-estrutura para a população e que deveriam passar completamente para a
iniciativa privada.
Refere-se aos serviços
de água, luz, correios, bancos, pesquisas, etc.
Setores não-exclusivos: aqui há uma redefinição de conceito,
pois para Bresser público e estatal poderiam ser coisas diferentes. Assim,
alguns setores poderiam ser públicos, mas não estatal obrigatoriamente.
Transfere-se, então, a
responsabilidade estatal por áreas sociais, como Educação, Saúde, Cultura,
Produção de Ciência e Tecnologia, para as mãos da iniciativa privada.
Este processo
denominado de publicização é o que mais corretamente pode ser chamado de
privatização dos serviços sociais. Já que legalmente era impossível repassar
estes setores totalmente para a iniciativa privada, transfere-se a responsabilidade
administrativa, mas o financiamento continua sendo público.
O instrumento para
realizar a implementação deste tipo de privatização seria a partir das
Organizações Sociais, as chamadas ONGs.
“... que seriam
entidades de ‘direto privado’, ‘sem fins lucrativos’, que deveriam manter
‘Contratos de Gestão’ com o Governo Federal, que entraria com o patrimônio
(instalações/equipamentos), pessoal, recursos orçamentários e, em
contrapartida, a entidade se responsabilizaria por um nível de atendimento da
demanda social, podendo vender serviços conforme sua capacidade”. O caso mais
presente em nossa cidade, como exemplo, se pode citar a Santa Casa de
Misericórdia que de misericórdia não tem mais nada.
Os principais ataques
privatizantes de FHC, que permitiram a implementação do gerenciamento privado
no SUS foram:
a) Lei 8.031 de 1990 –
institui o programa nacional de desestatização, ou seja, permite a ampla
privatização das empresas estatais;
b) Lei 9.401 de 1997 –
institui as agências executivas, flexibilizando as relações de trabalho dentro
de atividades ainda consideradas totalmente estatais;
c) Aprovação da Medida
Provisória nº 1591 de 1997 – define as Organizações Sociais
d) Aprovação da Emenda
Constitucional 19 de 1998 – “Modifica o regime e dispõe sobre princípios e
normas da Administração Pública, servidores e agentes políticos, controle de
despesas e finanças públicas e custeio de atividades a cargo do Distrito Federal,
e dá outras providências”.
e) Lei 9.937 de 1998 –
institui as Organizações Sociais, Contratos de Gestão e o Programa Nacional de
Publicação;
f) Lei 9.790 de 1999 –
institui as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip);
g) Lei 9.801 de 1999 –
trata da exoneração de servidores públicos por excesso de despesa;
h) Lei Complementar
101 de 2000 ou Lei de Responsabilidade Fiscal – impõe limites de gastos com
pessoal para cada esfera do governo e reforça a contratação através de empresas
terceirizadas.
Devemos ressaltar que
o governo do PT continua dando continuidade a este processo privatizante e Isso
ficou evidente com a criação do Projeto de Lei Complementar 92 de 2007, que
busca a regulamentação das Fundações Estatais de Direito Privada, as quais
serão analisadas em outro texto.
Por
enquanto, nos deteremos as Organizações Sociais.
Como já foi
demonstrado o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado e a implementação
das Organizações Sociais caminharam juntos.
Por isso, não é de se
estranhar que o anteprojeto de lei e o Decreto de Regulamentação das OSs também
foram elaborados em 1995.
Nestes documentos as
OSs tinham o papel de garantir a descentralização entre as três esferas de
governo (União, Estados e Municípios).
A Medida Provisória nº
1591, de 1997, definiu as Organizações Sociais como instituições de direito
privado sem fins lucrativos, que seriam parceiras do Estado, podendo abranger
as atividades não exclusivas do Estado, como ensino, pesquisa, tecnologia, meio
ambiente, cultura e saúde e em 1998 é aprovada a Lei 9.637 que regulamenta as
OSs.
E com isso, a partir
da legislação formulada, as Organizações Sociais ao gerenciar um serviço público
podem:
a)Contratar
trabalhadores através do regime CLT, ou seja, sem concurso público. Esta é uma
forma de acabar com o direito de estabilidade no emprego, algo próprio do
funcionalismo público. Os trabalhadores ficam a mercê das verbas transferidas
pelo governo para as OSs, e também dos jogos políticos que envolvem o contrato.
Caso haja corte de
verbas, o contrato seja cancelado, ou exista qualquer outro interesse da OS,
muitos trabalhadores podem ser demitidos de uma hora para outra.
Além disso, o regime
CLT amplia a competição entre os próprios trabalhadores, os quais sempre estão pressionados
a se sujeitar aos interesses do empregador e não necessariamente do serviço.
O regime CLT, também
aprofunda a divisão entre os trabalhadores, já que existem funcionários
públicos e celetistas trabalhando juntos, os quais possuem necessidades e
interesses muitas vezes diferentes.
Ademais, os celetistas
possuem maior dificuldade em lutar por seus direitos, já que podem ser
facilmente demitidos. Por fim, uma última questão com relação ao regime CLT, é
que este tipo de contratação permite o “empreguismo” e o favorecimento
político.
b) Os servidores
públicos podem permanecer no serviço quando a OS passa a gerir o mesmo, mas
deve-se salientar que estes servidores passam a desenvolver atividades para o
setor privado.
c) As OSs, a partir do
contrato de gestão, recebem recursos orçamentários do governo. No entanto,
mesmo as OSs sendo instituições privadas, as mesmas não necessitam de
licitação.
d) Não há algo que
regulamente as compras e contratos feitos pelas OSs, ou seja, estas
instituições podem usar o dinheiro público da forma que quiserem.
e) A OS não necessita
prestar contas sobre seus processos de contratação e aquisições de bens e
serviços a nenhum órgão de controle da administração pública, já que estas são
atribuições do Conselho de Administração, composto por membros que em sua
maioria é indicado pela própria OS.
Desta forma, pode-se
constatar a falta de transparência no uso de recursos públicos pela OS.
A fiscalização do
Estado se dá através de uma comissão de avaliação, que avalia os relatórios
elaborados pela OS. Estes relatórios têm como central dados referentes ao
cumprimento das metas.
A partir dos
mecanismos de funcionamento das OSs, pode-se compreender como estas entidades
sem fins lucrativos lucram.
Afinal, estando tudo
sobre controle do Conselho de Administração, o excedente de verba pública pode
ir diretamente para os bolsos dos dirigentes das OSs, como forma de
remuneração.
ENTÃO, Quando a Lei
das OSs estabelece que sejam qualificadas nesta condição somente as entidades
privadas sem fins lucrativos, assim como a Lei das OSCIP, mas concedem aos seus
respectivos Conselhos de Administração a prerrogativa de dispor sobre o plano
de cargos e salários e benefícios dos seus ‘empregados’, estão dispondo, em
outras palavras, da possibilidade de utilizar-se de eventuais excedentes
operacionais, brutos ou líquidos, dividendos ou bonificações, auferidos
mediante o exercício de suas atividades, distribuindo-os entre os seus sócios
ou associados, conselheiros, diretores ou empregados, na forma de suas
remunerações, tais como em salários, gratificações, auxílios e benefícios
diversos.
Com todos estes
privilégios, a participação da iniciativa privada que, segundo a Constituição Federal,
era para acontecer de forma complementar no SUS, acabou tomando conta de quase
todo o sistema de saúde nos municípios e estados que criaram as condições de
existência das OSs.
O que ocorreu, de
fato, com as terceirizações previstas na Lei das OSs foi a transferência, pelo
Estado, de suas unidades hospitalares, prédios, móveis, equipamentos, recursos
públicos e, muitas vezes, pessoal para a iniciativa privada”.
As Organizações Sociais na Saúde
Em São Paulo, um dos
estados que mais investiu na implementação das OSs na área de saúde, tem
aumentado de forma gritante os gastos com estas instituições (114,14% entre
2000 e 2007).
Sendo que os gastos
com pessoal caíram de 53,58% em 2000 para 39,6% em 2007.
Percebe-se aqui a
aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal e sua serventia, ou seja, investir
no setor privado em detrimento da manutenção do funcionalismo público.
No entanto, o governo
do estado de São Paulo justifica estes números, dizendo que as Organizações
Sociais permitiram maior produtividade com menor custo, em comparação com a
administração pública.
Porém, é preciso
ressaltar que esta produtividade é baseada em metas traçadas a partir de uma
lógica empresarial, o que é estranho a produção de saúde. Isso porque, a
promoção de saúde deve estar relacionada com a necessidade dos usuários de
saúde e não a números previamente calculados, ou seja, a metas.
Isso implica em ‘...
sacrificar a qualidade do atendimento para ter maior rendimento e atingir as
metas’.
Além disso, é por
conta das metas que alguns tipos de atendimento em saúde são mais valorizados em
detrimento de outros.
Assim, o trabalhador
de saúde perde sua autonomia em elaborar a melhor forma de responder a demanda
dos usuários de saúde e passa a ficar engessado no cumprimento de metas.
É por isso
que o regime CLT para contratação de pessoal é fundamental para as OSs, já que
a instabilidade em que se encontra o trabalhador o pressiona para cumprir
metas.
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VINHETAS NOTÍCIAS > VINHETA DA DENGUE
Em virtude de o tema
ter sido extenso hoje, deixaremos de apresentar o nosso bloco de notícias
completo, resumindo apenas as mais importantes:
Prefeitura assina contrato com 4
hospitais para 2.307 cirurgias
O prefeito Carlinhos Almeida assinou
nesta segunda-feira contratos com quatro hospitais para a realização de mais
2.307 cirurgias do mutirão de saúde. Antoninho da Rocha Marmo, Pio XII, GACC e
Santa Casa são os primeiros hospitais que concluíram o processo do
credenciamento e estão aptos a começar as cirurgias.
Prefeitura assina convênio com
Cruzada Assistencial
A Prefeitura
de São José dos Campos assina nesta quarta-feira, às 14h, no Paço Municipal, a
renovação de dois convênios de subvenção – municipal e federal – com a entidade
Cruzada Assistencial Padre João Guimarães para atendimento de crianças e
adolescentes em abrigos.
FCCR abre inscrições para Mostra
Joseense de Teatro
As
inscrições para a edição 2013 da Mostra Joseense de Teatro estão abertas. Os
interessados em participar devem se inscrever até o próximo dia 12, na sede da
Fundação Cultural Cassiano Ricardo (FCCR – Avenida Olivo Gomes, 100), em
Santana.
Prefeitura convoca audiência pública
para debater alterações
A
Prefeitura de São José dos Campos realiza no dia 15 de abril uma audiência
pública para discutir a proposta de adequação da Lei de Zoneamento. O encontro,
organizado pela Secretaria de Planejamento Urbano, é aberto para toda a
população e visa garantir a participação da sociedade no aprimoramento do texto
que regula o uso e a ocupação do solo na cidade.
Inscrição para eleição de
conselheiros vai até 5 de abril
As inscrições para as eleições do
Conselho Tutelar de São José dos Campos se encerram no dia 5 de abril,
sexta-feira. Os interessados deverão formalizar o pedido de inscrição na sede
do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – CMDCA (Avenida
Dr. João Guilhermino, 429 – 1º Andar – S/11 – Edifício Saint James). A eleição
será no dia 16 de junho.
Prefeitura insere mais 1.646 famílias
em programa social
São José
dos Campos tem mais 1.646 famílias inseridas no programa Bolsa Família, do
governo federal. A inclusão deste grupo ocorreu na segunda quinzena de março,
devido à ampliação de vagas anunciada pelo Ministério de Desenvolvimento Social
e Combate à Fome.
Projeto Basquete Escolar começa em
unidade da região leste
A Escola Municipal de Ensino
Fundamental (EMEF) Professora Maria Amélia Wakamatsu, no bairro Campos de São
José, região leste de São José dos Campos, lançou o ‘Projeto Basquete Escolar’,
que tem o patrocínio da Petrobras. A iniciativa, que visa prevenir situações de
risco por meio do esporte, está aberta a crianças da comunidade que tenham
entre 9 e 13 anos de idade.
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